Fim do mundo, acabou o agro? Não, mas se continuarmos com a política de matar o mensageiro, vai ficar difícil

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Por Eduardo Assad

Indicar alertas e tendências ruins para a sociedade tem sido uma constante na vida de cientistas que estudam as mudanças do clima.  Ninguém gosta de notícia ruim, porém matar o mensageiro é uma prática que remonta à Antiguidade e persiste até hoje.

A Casa Branca mandou cancelar de imediato todos os seminários, reuniões de comitês, viagens e solicitações de fundos para participação em congressos e conferências sobre mudanças do clima nos vários institutos, que têm juntos orçamento de US$ 48,6 bilhões. Alguns encontros foram cancelados minutos antes de começar. De quebra veio a censura e o corte de financiamentos em outros setores, como bilhões para financiar pesquisas sobre mudanças climáticas, que Trump sequer mencionou no discurso inaugural: Departamento de Energia (US$ 51 bi), Nasa (US$ 25 bi), EPA (US$ 11 bi).  Esse total equivale a 508 bilhões de reais, ou seja, menos do que o Brasil perdeu nas safras agrícolas dos últimos cinco anos.

Os cientistas americanos já estão acostumados com este presidente bravateiro. No primeiro governo tomou as mesmas atitudes. Porém quando se mexe com gente inteligente e preparada, o impacto é diferente. Os cientistas imediatamente cortaram as palavras mudanças climáticas do vocabulário e passaram a adotar mudanças globais. E a produção científica financiada por outros meios continuou a pleno vapor. O confronto da ciência com ditadores e tiranos é antigo. Que o diga Galileu Galilei: “A ciência venceu todas, com muita paciência e competência.”

Recentemente num encontro sobre seguro rural no Brasil, um dos nossos principais cientistas brasileiros apresentou números alarmantes, para alguns catastróficos, para outros, realistas. Numa pequena amostra do que foi apresentado pelo Prof. Paulo Artaxo, da USP e um dos principais cientistas do clima no Brasil, indica que:

“As emissões estão aumentando, enquanto deveriam estar diminuindo. Já ultrapassamos os 1,5ºC previstos no acordo de Paris para 2030. Dificilmente vamos conseguir segurar o aumento da temperatura até 2ºC para o mesmo período. Eventos extremos vão ocorrer com uma frequência 39 vezes maior do que hoje, nos próximos 50 anos …”.

Ao mesmo tempo algumas possíveis soluções para o Brasil foram apontadas:

– Potencial de grande redução de emissões sem prejuízos à sociedade;

– Potencial de produzir energia solar e eólica que nenhum outro país possui;

– Programa de biocombustíveis único no mundo;

– Potencial de sequestro de carbono, com geração de renda através do mercado de carbono, uma indicação importante com relação à nossa agricultura, que é extremamente vulnerável aos eventos extremos. 

Em meio ao anúncio da supersafra deste ano, notícias como as perdas de 80% da produção de soja no RS, estimada até dia 27/01/2025 vão chegando.

Alguns estudos da Embrapa referentes a atualização do ZARC (Zoneamento Agrícola de Riscos Climáticos) indicam uma redução da janela de plantio na região Centro-Oeste, especificamente no Estado de Goiás, de até 30 dias. Mesmo resultado foi encontrado pela equipe do GVagro da FGV, que indicou aumento de até 30 dias secos somente na janela de plantio do milho segunda safra.

O que significa isto?

Perda enorme da oportunidade de mantermos a primeira e segunda safra. Com isso comprometemos a produção de milho segunda safra no Brasil em até 104 milhões de toneladas.

Fim do mundo, acabou o agro? Não, mas se continuarmos mantendo a política de matar o mensageiro, vai ficar difícil.

Urgentemente as opões factíveis são:

– Eliminar o desmatamento na Amazônia e nos demais biomas até 2030, ou seja, TODOS os desmatamentos, ilegais e legais.

– Lembrar que o Código Florestal foi estabelecido antes de termos esta situação emergencial no clima;

– Acelerar o programa de agricultura e pecuária de baixo carbono que já está prevista nas orientações do seguro rural e que não estão sendo adotadas; e

– Plantar árvores.

Alguns grupos dizem que se formos levar em consideração o que os discursos “alarmistas” dizem, não vamos adotar o seguro rural.

Concordo. Mas simplesmente porque não vai ter o que segurar. Vamos perder muito.

O momento de agir é mais do que necessário. Não vamos matar os mensageiros.

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