Que possamos ter um Feliz 2025

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Leonor Assad

De acordo com o World Food Programme (WFP na sigla em inglês), maior agência humanitária de combate à fome do mundo, atualmente 343 milhões de pessoas estão enfrentando fome aguda em 74 países. Se não começarmos a reduzir imediata e drasticamente as emissões de gases de efeito estufa (GEE) para a atmosfera, cometeremos um suicídio ecológico, que poderá extinguir milhares de espécies, aniquilar biomas e tornar grande parte do planeta inabitável até mesmo para nós, seres humanos. Quem afirma é Carlos Nobre, pesquisador colaborador do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da Universidade de São Paulo, em entrevista para o Jornal da USP neste início de dezembro. E mais, com a confirmação de que novembro foi mais um mês com temperaturas escaldantes, o observatório Copernicus, da União Europeia, já dá por certo que 2024 será o ano mais quente da história da humanidade.

Por outro lado, em artigo publicado na Revista Estudos Avançados, Ricardo Abramovay mostra que a separação radical, a partir de Descartes, entre o ser humano e a natureza, está na base da onda de inovações no sistema agroalimentar atual, cuja fronteira tecnológica busca justamente emancipar a alimentação humana de sua dependência do ambiente, ou seja do clima, do solo e dos animais. Apoiando-se na obra O princípio responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica, de Hans Jonas (1903-1993), Abramovay aponta que o risco dessa fissura entre alimentação e natureza é que não se enfrente o principal desafio do sistema agroalimentar contemporâneo, que reside em sua crescente monotonia. E acrescenta, “para Jonas a ética da civilização tecnológica consiste em reduzir ao mínimo o atual fosso que separa o ser humano do restante da natureza”.

Mas existem alternativas e pouco a pouco elas vão se consolidando no Brasil e servindo de exemplo para o mundo. No início deste ano, passou a vigorar no Brasil a nova composição da cesta básica brasileira (Portaria 966), composta por alimentos de dez grupos diferentes: feijões (leguminosas); cereais; raízes e tubérculos; legumes e verduras; frutas; castanhas e nozes (oleaginosas); carnes e ovos; leites e queijos; açúcares, sal, óleo e gorduras; café, chá, mate e especiarias.

Mais recentemente, pesquisa da Embrapa divulgada na COP 29, em Baku no Azerbaijão, apontou que em 2024, 64% dos produtores brasileiros utilizaram biofertilizantes e 61% biodefensivos, superando dados de 2022. A título de comparação, o conjunto dos países europeus utilizaram 33% e 25%, respectivamente. E mais, a adoção de práticas de agricultura regenerativa –como reduzir os processos erosivos; adotar o sistema plantio direto com rotação de culturas; manter o solo permanentemente coberto com palha ou vegetais em crescimento; fazer o mínimo de revolvimento do solo; e praticar semeadura em nível– são fundamentais para assegurar menor emissão de GEE e maior segurança alimentar para a população.

2024: um ano com avanços na relação agricultura e ambiente

Nos últimos anos, a produção agrícola brasileira tem passado por modificações rápidas pressionada por mudanças no clima e em função de mudanças nos custos de produção e nas demandas dos consumidores quanto à segurança alimentar. Tem crescido também, ainda que de forma setorizada, a busca por produtos e por sistemas de produção que não causem grandes impactos na vegetação nativa.

De agosto de 2023 a julho de 2024, houve queda do desmatamento na Amazônia (quase 46%), o que constituiu a maior queda histórica proporcional já registrada no período. Infelizmente, no Cerrado, o desmatamento aumentou 9% no mesmo período, com destaque para os estados do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), que concentraram 75% da área sob alertas de desmatamento no bioma.

Uma prática importante, cuja adoção vem crescendo no Brasil, é o sistema agroflorestal (SAF). O SAF, ou melhor os SAFs, dada a sua grande diversidade, são formas de uso e manejo da terra no qual árvores ou arbustos são utilizados em consórcio com culturas agrícolas, forragens e/ou integração com animais, gerando interações ecológicas e econômicas dentro do sistema de produção. Na esteira dos SAFs surgiram também os quintais florestais (QAF), como consequência da movimentação de pequenos e médios produtores para a periferia de grandes e médias cidades.

E mais, neste ano, quando o Brasil liderou o G20 até 30 de novembro, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou um novo volume da coleção de estudos Criando Sinergias entre a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e o G20, que aponta que em 2023 as áreas protegidas brasileiras representaram 30,6% do área terrestre do país, colocando o Brasil na segunda posição no ranking do G20, depois da Alemanha (37,6%).

Outra boa notícia de 2024 consta do relatório do Fórum Econômico Mundial divulgado em junho deste ano, que aponta que o Brasil subiu para a 12ª posição no Índice de Transição Energética (ETI), ocupando o primeiro lugar entre os países emergentes e o terceiro lugar, entre as nações participantes do G20. As principais iniciativas apontadas foram o compromisso de longo prazo com a energia hidrelétrica e os biocombustíveis, aliado a avanços significativos na geração de energia solar.

Em julho deste ano, os Ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, das Cidades, e da Ciência, Tecnologia e Inovação lançaram o Programa Cidades Verdes Resilientes, com o objetivo de aumentar a qualidade ambiental e a resiliência das cidades brasileiras diante dos impactos da mudança do clima, por meio da integração de políticas urbanas, ambientais e climáticas e estimulando as práticas sustentáveis e a valorização dos serviços ecossistêmicos do verde urbano. Com isso, inúmeras iniciativas têm sido implantadas em cidades brasileiras pela população local organizada.

Mas ainda há muito o que avançar. Apesar de ser um dos países do G20 que mais perderam cobertura florestal nas últimas duas décadas, de 2015 a 2020 a taxa foi de 0,29% ao ano, abaixo dos 0,6% ao ano em média no período 2000 a 2015. Infelizmente, quando se considera a proporção de área protegida nas áreas-chave para a biodiversidade (KBAs na sigla em inglês), o Brasil cai para a sétima posição, com 45,7%, bem atrás dos líderes Reino Unido (83,4%), França (81,1%), Alemanha (79,2%) e Itália (76,7%).

Ainda  assim, avanços têm sido feitos. Pesquisa de opinião pública sobre mudança climática “People’s Climate Vote 2024”, realizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)  com a Universidade de Oxford e o Instituto GeoPoll, apontou que 85% dos brasileiros desejam que o governo tome medidas mais firmes para enfrentar a crise climática, superior ao porcentual mundial (80%). O porcentual brasileiro é o terceiro mais alto registrado entre os 20 países mais poluentes do mundo. E mais, no Brasil 90% apoiam a união dos países em prol da ação climática, contra 86% no restante do mundo.

Outra pesquisa, realizada pelo Datafolha em junho deste ano, apontou que 97% da população brasileira percebe os impactos da crise climática em seus cotidianos. A totalidade dos entrevistados afirmou que adotaria alguma mudança. Dentre as medidas mais populares foram apontadas a troca de lâmpadas domésticas por modelos mais econômicos (99%), redução do uso de plástico e embalagens descartáveis (94%), instalação de painéis solares em casa (89%), pagar mais caro por produtos com baixa emissão de carbono (74%) e por um carro elétrico, ao invés de um modelo a combustão (63%).

São dados e notícias que me estimulam a continuar trabalhando em prol da mitigação e da adaptação às mudanças do clima que estão em curso. Há muito o que fazer. Espero que em 2025 sejamos cada mais numerosos na construção e implantação de projetos sustentáveis. Acredito cada vez mais que é possível viver em áreas urbanas ou no campo, produzindo e criando de forma sustentável. Afinal, para nós da Fauna Projetos sustentabilidade é para todos e não um luxo para alguns.

Que todos nós possamos ter um Feliz 2025!

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